sexta-feira, 8 de maio de 2009

Potes

Os sentimentos são algo de estranho. Magoam-nos tanto como nos dão prazer.
Instinto de morte/ instinto de vida. Principio do prazer/ Principio da realidade. Se no primeiro a necessidade de gratificação é imediata o segundo, pauta-se pela capacidade de adiamento da mesma. Ao longo da nossa vida tentamos aprender a gerir ambos de forma a termos um funcionamento dito normativo.
Fugimos à dor e corremos atrás do prazer.
As coisas simples são sempre as mais difíceis de alcançar. É tão difícil dizer "gosto de ti" e igualmente difícil lidar com a rejeição, com o não ter tido a ousadia de mostrar que se gosta. Criamos barreiras, afastamo-nos e surge a meta-comunicação como estrutura defensiva do Ego: "Nem reparei na tua ausência" em vez de "Tenho saudades"; "Talvez" em vez de "sim, quero"; "Faz o que quiseres" em vez de "Fica comigo". A palavra atirada, jamais será recuperada.

Como já referi inúmeras vezes não lido bem com o luto - calcanhar de Aquiles.
O meu amor desde sempre esteve dividido em potes e arrumado em prateleiras. Cada pote pertence a alguém, alguma coisa, objecto ou actividade. Guardo-os religiosamente e faço a sua manutenção...até ao dia em que se partem. Hoje partiu-se um.

Cada pote partido é um lugar vazio na prateleira, nada voltará a ocupar esse lugar. Parti-me. Ao longo dos anos tem-se partido alguns potes que acabam a moldar de forma negativa quem sou. Alteram o meu Eu, perco alegria e crença. Resta-me a fé...é grande...Acalmo...perco-me e luto para me encontrar.
As perdas, a dor e as desilusões são necessárias à homeostasia da mente e do corpo. Aprendemos a sobreviver e a valorizar sentimentos que se não fossem postos à prova nunca teriam verdadeiro significado e força. Mas também aprendemos a fecharmo-nos, a isolarmos os que restaram e precisamos de conservar a bem da sobrevivência. A nossa sobrevivência. A minha.

Esta luta desgasta-me, faz-me avançar e recuar sem rumo. Objectivo ou mito. Real ou imaginário. Utopia ou palpavel. Apenas defensivo. Defesa a minha. Quero dar-me mas não quero mais perder. Risco. Medo...ou simplesmente cobardia emocional. Penso, repenso. Martirizo-me e recuo. O que será menos doloroso? Arriscar nova perda ou recuar antes de haver hipótese de perder? Escolho a segunda, por falta de coragem para a primeira. Segura, básica. Instinto de sobrevivência. Adiamento da gratificação. Principio do Prazer obtido unicamente através de coisas que controlo e domino. Não me atingem. Sou melhor fria.

Hoje partiu-se outro pote. Não o recupero...não o quero recuperar. Dói e não gosto. Enfraquece-me e deixa-me vulnerável...Fico a sentir-me pessoa...pior...pessoa e banal. Analogia: O meu humor. Amor. Uma taça de água estável, equilibrada e parada...abanam a mesa e a água oscila, todas as particulas alteram a sua posição. Nenhuma volta ao estado inicial. Como se faz para voltar?
Merda de semana. Merda de dia.

8 comentários:

Fernando K. Montenegro 8 de maio de 2009 às 15:31  

Para já, só estas palavras:

Merda! Brutal desabafo!

Volto cá...para comentar este texto como ele merece. Volto - porque me apetece :)

Anónimo,  12 de maio de 2009 às 10:35  

As nossas prateleiras são bem maiores do que muitas vezes pensamos, Lagarta. Chegarás à conclusão que os potes que se partem, partem-se porque não precisamos deles na nossa prateleira. Tiveram com toda a certeza uma função ou missão, mas é pura perda de tempo e energias esquecer os restantes espaços por ocupar e prateleiras, e ficar a olhar para os espaços vazios onde outrora estavam potes.

Não sei se é suposto voltar... se o for não faço ideia de como se faz, mas também não me parece que o queira, vamos sendo sempre uma versão revista, alterada, actualizada e melhorada, certo? ;)

Somos isso tudo, Lagarta! Vulneráveis de quando em vez e absolutamente impenetráveis outras, temos medo de arriscar às vezes e não há nada que nos atemorize ou pare em outros momentos. Somos isso tudo...

Tem calma, Lagarta, não ponhas tudo em causa porque um pote se partiu, faz parte. Já partiste potes antes, e já passaste para os outros espaços das prateleiras, é doloroso, é o mesmo processo novamente, mas é esse o caminho, sem medos ou dúvidas, sem hesitações ou estagnações.

Estou contigo, e tenho comigo a minha harpa, se não te alegrar pelo menos enquanto me persegues, amarras e amordaças ganhas apetite para o banquete e a festança, e vais renovando, sem dar conta, as energias :P

Um sublime dia, Lagarta, sorri, não te esqueças!

Abraço e beijinho grande!


PS: Somos demasiado fortes para nos deixarmos abalar com merdas de dias, Lagarta! Hmmm tu és, anyway... ;)

Me 12 de maio de 2009 às 13:33  

Não vejo isso assim.
O pote não se partiu, está é noutra prateleira... Continua lá... Está é noutro sítio onde não é tão fácil meter-lhe a mão, tocar-lhe... Só isso.

Um beijo para ti.

L. K. 12 de maio de 2009 às 20:38  

Lorenzo,

os meus desabafos são gritos mudos que me sufocam e se propagam no vazio parando antes de atingirem a audição de outrém...aqui fica mais fácil dar-lhes um som :)

L. K. 12 de maio de 2009 às 20:48  

Não concordo Gaulês,

os pots a que me refiro fazem parte e falta nas nossas prateleiras são o amor bi-direccional overwhelming e inquestionavel. São potes de um amor que não quer saber do teu passado, presente ou futuro e apesar de por vezes poderem estar menos de acordo estaram sempre lá para apoiar e te defender "no matter what".

Não é preciso olhar para o espaço vazio que estes potes deixam para saber que existem e é um espaço que ficará vazio até perecermos.

E claro que sim: com o passar do tempo somos uma versão de nós próprios revista e melhorada mas até esses melhoramentos não ocultam ou ocupam o lugar vazio apenas transformam a dor e a saudade num sentimento carinhoso de lembrança e amor tendo por base a certeza que se fez tudo o que se podia e o resto Deus se encarregou de dar um rumo visando a extinção do sofrimento de todos os intervenientes.

O luto tem um tempo de vida muito proprio que tem de ser cumprido para que não s etorne uma ferida infectada e termine em septicemia. Cumpro meu até nada restar do mesmo e recuso qualquer tipo de panaceia ou pacho que lhe tire a intensidade ou abrande a dor. Resolvo-o porque só sofro uma vez por uma coisa...a seguir fecho a porta e guardo o que ficou de melhor desse pote...mais que não seja o seu lugar vazio que simbolizará sempre o que representa para mim ;)

O meu sorriso é a unica coisa garantida :P

e a minha força vem da consciência dos meus limites, das minhas fraquezas, das adversidades e da superação sã de todos os potes partidos :)

L. K. 12 de maio de 2009 às 20:50  

Minha querida Me e eu não vejo isso assim...os meus potes partem-se mesmo, não vão para o sotão pois um dia poderiam soltar-se ou conseguir inadvertidamente tocar-lhes e reviver tudo novamente.
Prefiro resolver a perda do mesmo e comtemplar um belo espaço em branco por onde os raios de sol passam de cada vez que preciso deles :)

Beijos para ti.

Me 13 de maio de 2009 às 00:22  

ohhh...
atão nego-te a afirmação de que lidas mal com o luto...

:)

L. K. 13 de maio de 2009 às 00:26  

Me, Lamento mas não me podes negar essa afirmação...lido mal com o luto, existem é lutos diferentes e lido com um e outro de forma diferente: num não substituo o lugar do pote, não o recupero; no outro luto deixo o lugar vazio até pote digno de nova ocupação ou pseudo-ocupação ...esclarecida :P

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